terça-feira, 11 de junho de 2013

PSICOLOGIA APLICADA AO DIREITO- VARA DE FAMÍLIA-CASOS CONCRETOS





Foto:  Botero





1-       No contexto da atuação do psicólogo junto às varas de família, considere as afirmações abaixo:

I-                    O laudo pericial decorrente de um psicodiagnóstico visa fornecer subsídios para que o juiz enuncie uma sentença;

II-                  O laudo pericial pode ser elaborado a partir de quaisquer técnicas da Psicologia;

III-                O papel do psicólogo-perito na vara de família pode ser, também, o de um “mediador”, transformando a perícia numa relação de ajuda às famílias.

É CORRETO o que se afirma em:
(a ) I, II e III.
(b ) I e II, apenas;
X(c ) I e III, apenas;
(d ) II e III, apenas;
(e ) III, apenas.

R:  A resposta CORRETA       é a letra (c ).


CASO CONCRETO

2. Situação: casal recém-divorciado não consegue entrar em acordo com relação à guarda dos filhos, um menino de 5 anos e uma menina de 3 anos. A mãe quer permanecer com os dois filhos com visitas e fins de semana alternados com o pai, mas este quer a guarda das crianças, com o mesmo sistema de visitas e fins de semana alternados, pois julga a mãe negligente com relação às crianças. Esta acredita que isto se deva ao ressentimento dele por ela ter solicitado a separação. Várias conversas foram tentadas e não foi possível chegar a um acordo. O juiz solicita a intervenção de um psicólogo. O psicodiagnóstico que incluísse entrevistas e métodos projetivos poderia ser mais útil, neste caso, para:

( a ) traçar um perfil de personalidade da mãe das crianças que permitisse confirmar ou descartar sua negligência;
X( b ) avaliar a capacidade dos pais de lidar com fatores de sobrecarga emocional;
(  c ) traçar um perfil de personalidade do pai mostrando a possibilidade ou o impedimento para cuidar de crianças;
(d ) definir presença de transtornos depressivos, associados aos comportamentos descritos;
( e ) relacionar a influência de distúrbios do pensamento sobre a percepção da realidade.



R:  A resposta  CORRETA é a letra  (b).




CASO CONCRETO

3. Lídia Rosalina Folgueira Castro, em seu livro? Disputa de guarda e visitas: no interesse dos pais ou dos filhos, menciona o fato de que os estudos atuais sobre a problemática afetiva dos ex-casais em disputa atribuem-lhe como causa o ex-casal não ter conseguido elaborar a separação. Refutando esta ideia a partir do que encontrou nos casos que analisou, procurou compreender porque a ideia é tão generalizada. Acredita ser importante que se compreenda que a separação, embora seja um momento sempre muito difícil, não se dá da mesma forma e pelas mesmas razões para todos os indivíduos. Podemos ter algumas separações que trazem conseqüências desastrosas para o desenvolvimento das crianças. Descreva uma destas situações.
                 (ADAPTAÇÃO ANALISTA JUDICIÁRIO-PSICÓLOGO-PE/2007)

R: Dentro das situações possíveis, estaria a “Síndrome de Alienação Parental”, pois mexe com o emocional da criança e/ou do adolescente, principalmente, quando um dos cônjuge desmoraliza o outro.
       SAP é termo proposto por Richard Gardner, em 1985, para a situação em que a mãe ou o pai de uma criança a treina para romper os laços  afetivos com o outro cônjuge, criando fortes sentimentos de ansiedade e temor em relação ao outro genitor. Os casos mais freqüentes da Síndrome da Alienação Parental (SAP) estão associados a situações onde a ruptura da vida conjugal gera em um dos genitores, uma tendência vingativa muito grande. Quando este não consegue elaborar adequadamente o luto da separação, desencadeia um processo de destruição, vingança, desmoralização e descrédito do ex-cônjuge. Neste processo vingativo, o filho é utilizado como instrumento da agressividade direcionada ao parceiro. 
         A Alienação Parental não é um problema somente dos genitores separados. É um problema social, que, silenciosamente, traz conseqüências nefastas para as gerações futuras. 
         A lei prevê medidas que vai desde o acompanhamento psicológico até a aplicação de multa, ou mesmo a perda da guarda da criança a pais que estiverem alienando os filhos. A Lei da Alienação Parental, Nº 12.318 foi sancionada no dia 26 de agosto de 2010.
       Isto posto, as pesquisas sobre PAD confirmam:

·           80% dos filhos de pais divorciados já sofreram algum tipo de alienação parental. [1]
  • Estima-se que mais de 20 milhões de crianças sofram este tipo de violência [2]
Referências
[1] CLAWA, S.S.; RIVIN, B.V. Children Held Hostage: Dealing with Programmed and Brainwashed Children. Chicago, American Bar Association, 1991. 
[2] Dados da organização SplitnTwo [www.splitntwo.org].
[3] Gardner R. Parental Alienation Syndrome vs. Parental Alienation: Which Diagnosis Should Evaluators Use in Child-Custody Disputes?. American Journal of Family Therapy. March 2002;30(2):93-115.
In. http://www.alienacaoparental.com.br/, acessado em 22/04/2013, às 16;13




CASO CONCRETO

4- Tendo em vista pesquisas e debates atuais acerca da atuação do Psicólogo nas Varas de Família, principalmente no sentido de auxiliar na indicação de qual genitor deve, em caso de disputa entre os cônjuges, exercer o papel de guardião dos filhos, quais fatores o Psicólogo Jurídico deve  tomar como base para sua análise?
                    ( ADAPTAÇÃO- SEAD/SEJUDH- PSICÓLOGO/2007)



R:    De acordo com o  Art. 1.584 CC –Decretada a separação judicial ou o divórcio sem que haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos,será ela atribuída a quem revelar melhores condições de exercê-la. Portanto, esta é uma das primeiras bases, mas também ouvir a criança, respeitando o seu direito de escolha e a sua dignidade de pessoa humana.

       A demanda para atuação do psicólogo em Vara de Família se apresenta em processos jurídicos que despontam no Direito de Família, área do Direito
Civil. Sendo assim, pode-se considerar como marcos legal no trabalho a ser desenvolvido nessa área a Constituição Federal da República Federativa Brasileira (1988), a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (1989), o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), o Código Civil Brasileiro (2002) a recente Lei da Guarda Compartilhada (2008), entre outros.
       A partir desses marcos legal  têm-se a indicação de que, hoje, a noção de família é plural, uma vez que se percebe a constituição de distintas configurações familiares. Nesse sentido, para alguns o termo entidade familiar estaria mais de acordo com a realidade que se observa no século XXI, composta por diversos arranjos familiares que incluem famílias formadas pelo casamento, por uniões estáveis, famílias recompostas, famílias homoafetivas, etc. Em consequência, a família não é reconhecida apenas a partir do casamento, como ocorria anteriormente. A igualdade de direitos entre homens e mulheres é assegurada constitucionalmente (Constituição Federal de 1988, art. 226, parágrafos 3º, 4º, 5º), não existindo mais a figura de “cabeça do casal”. Compreende-se, hoje, que numa sociedade conjugal o homem e a mulher são sujeitos autônomos, com vontades e percepções nem sempre iguais, mas que possuem os mesmos direitos e obrigações perante a família e os filhos. Outro ponto como garantido constitucionalmente.
        No Brasil, o casamento pode ser rompido desde 1977, quando foi sancionada a denominada Lei do Divórcio (Lei nº 6.515, de 26/12/1977). Desfeita a união conjugal, há possibilidade de serem formados novos casais, surgindo, por vezes, dilemas sobre os cuidados e as atribuições com os filhos da união anterior. Outro indicador importante para os que trabalham na área são os direitos infanto-juvenis, entre eles o direito à convivência familiar e comunitária, que deve ser garantido a toda criança ou adolescente, inclusive nos casos de dissolução conjugal. Desta forma, torna-se distante o tempo em que se alegava a existência de um instinto materno
para justificar a guarda atribuída preferencialmente às mães, como previa a Lei do Divórcio (1977). Naquela época, achava-se que após a que cabe destacar é a não discriminação relativa à filiação, como separação conjugal a guarda dos filhos deveria ficar restrita a um dos pais, cabendo ao outro o direito de visitação. Esse direito de visita só não era estabelecido quando a Justiça compreendia que o encontro da criança com um de seus genitores poderia acarretar-lhe prejuízos. Era de praxe, naquele período, o estabelecimento de visitas em finais de semana alternados, disposição que ao longo do tempo se percebeu que contribuía com a acentuada redução no relacionamento dos filhos com um dos genitores e com a família extensa deste. Pesquisas realizadas com filhos de pais separados mostram que, com frequência, filhos reconhecem que após o desenlace conjugal dos pais ocorre acentuado distanciamento daquele que não permaneceu com a guarda (WALLERSTEIN, LEWIS e BLAKESLEE, 2002; BRITO, 2008).
         Ainda de acordo com a Lei do Divórcio, aquele que fosse considerado culpado pela separação, descumprindo deveres do casamento previstos no Código Civil, não ficaria com a guarda dos filhos, como disposto no artigo 10 daquele diploma legal. Entendia o legislador que não poderia
ser considerado bom pai, ou boa mãe, quem não demonstrou ser bom marido, ou boa esposa. Unia-se, portanto, conjugalidade e parentalidade, orientação que também vigorou em legislação de outros países.
Um dos motivos para o encaminhamento dos processos na Justiça era a disputa pela guarda dos filhos. Como naquela época a primazia da guarda era dada à mulher, em casos de solicitação do pai para
permanecer com a guarda dos filhos, havia necessidade de alegar que a guarda materna seria prejudicial às crianças, muitas vezes atribuindo-se
às mães problemas psíquicos. Nessas circunstâncias, era comum o pedido de realização de perícia, para que se avaliasse a situação, havendo, por vezes, pedido para que o perito indicasse qual dos pais possuía melhores condições emocionais para permanecer com a guarda dos filhos. Posteriormente, o Código Civil Brasileiro de 2002 veio dispor, no artigo 1.5847 , indicação de que a guarda dos filhos deveria ser atribuída àquele pai ou àquela mãe que revelasse melhores condições de exercê-la, alterando-se assim a visão de que a guarda deveria ser deferida preferencialmente para as mães.
Como esclarece Brito (2002b), o critério das melhores condições já havia sido colocado em prática nos anos 1970 e 1980 em outros países, sendo desaconselhado pelo fato de que as guardas continuavam sendo atribuídas às mães em grande parte dos casos. Para responder àquele critério, diversos instrumentos foram elaborados e utilizados, como questionários, testes, inventários de interesses, com a intenção de averiguar qual dos pais apresentava melhores condições, devido à compreensão de que a guarda deveria ser monoparental. Notou-se, entretanto, que com aquela visão equiparava-se a separação conjugal à parental, depreendendo-se que, se a primeira ocorresse, a segunda seria inevitável. Dessa maneira, restringia-se o interesse da criança à alternativa parental. Concluiu-se também que a disputa pela guarda, fomentada pela legislação, contribuía por aumentar o enfrentamento entre os genitores da criança, que buscavam, avidamente, provas que desqualificasse o outro. Os filhos eram alçados ao lugar de pomos da discórdia, por vezes solicitando-se que descrevessem e avaliassem o comportamento dos
pais. Instalava-se uma encenação sobre habilidades e depreciações de comportamentos, procurando-se atestados e provas de incompetência de ambos os pais. Esse duelo de virtudes, que se fazia necessário para responder ao disposto na legislação, resultava no aumento de hostilidade e agressividade entre as partes, com repercussões nos filhos. Como observado por Ramos e Shine (1994, p. 12): Os dois trocam acusações graves de incompetência no cumprimento das funções paterna e materna, baseando-se em fatos que, em outro contexto, seriam irrelevantes. Os detalhes do cotidiano de qualquer família (como a falta do corte de unhas ou o esquecimento do material escolar) são pinçados e magnificados sob uma lente de aumento. (Ramos e Shine, 1994).
       A partir da segunda metade do século XX, estudos das ciências humanas mostraram que a separação dos cônjuges pode ocorrer pelo fato
de estes, ou de um deles, não possuir mais vontade de permanecer junto, não cabendo a atribuição de culpa a um dos membros do casal, uma vez que na conjugalidade, por vezes, a dificuldade que surge provém da dinâmica relacional. Da mesma forma, compreendeu-se que as crianças podem e devem conviver com o pai e com a mãe, mesmo que estes não formem um casal. Evidenciou-se, também, o quanto as disposições legais que definem questões relativas à atribuição de guarda podem com prejuízos na preservação dos vínculos de filiação (HURSTEL,1999). Assim, a partir do disposto na Convenção Internacional dos Direitos da Criança (1989), passa-se a indicar que toda criança tem o direito de ser cuidada e educada por sua mãe e por seu pai, independentemente do fato de estes residirem juntos ou não, o que remete à importância de pensar no compartilhamento da guarda quando os pais se separam. No que se refere à guarda, compreendeu-se que a desigualdade, até então praticada, não seria um fator natural, ressaltando-se a importância
de se garantir o acesso da criança tanto à linhagem materna como à linhagem paterna. Parte-se, agora, do entendimento de que as obrigações de educar e cuidar dos filhos seriam decorrentes do vínculo de filiação e não do casamento. Nesse rumo, a promulgação no Brasil da Lei nº 11.698/2008, que instituiu a guarda compartilhada como modalidade preferencial, busca igualar pai e mãe em relação à guarda de filhos. Visam-se a separações menos conflituosas e a uma presença mais incisiva de ambos os pais na educação das crianças, reafirmando-se a responsabilidade destes com seus descendentes. Como afirma Maria Lúcia Karan (1998):
Inicialmente, deve se ressaltar que a  concretização do princípio da igualdade entre homens e mulheres, expressamente consagrado no artigo 5°, inciso I da Constituição Federal, passa necessariamente pelo estabelecimento de uma nova forma de relacionamento entre pais e filhos, e que o papel do pai não seja mais o de um simples coadjuvante, dividindo sim com a mãe as
funções de criação e educação dos filhos.(KARAN,1998, p. 189).
          Acredita-se que a guarda compartilhada possa funcionar como suporte social simbólico, oferecendo sustentação à dimensão privada do
exercício da maternidade e da paternidade. Nesta modalidade de guarda busca-se uma divisão mais equilibrada do tempo que cada pai passa
com o filho, garantindo-se também a participação dos dois na educação da prole (BRITO, 2003).
A determinação da guarda compartilhada vai apontar para os pais, em termos simbólicos, que não há um único responsável pela criança,
ao contrário, o que se reafirma é a dupla filiação. Nesse sentido, Hurstel (1999) sugere que se preste atenção ao entrelaçamento do singular e do
social, na medida em que reconhece que o contexto social pode apoiar ou fragilizar o exercício da paternidade ou o da maternidade.
Destaca-se que, em alguns países europeus, nos casos em que se percebe como inviável a adoção da guarda compartilhada, indica-se que
a criança permaneça com aquele genitor mais permissivo em aceitar a participação do outro pai junto à criança. Há que se recordar ainda que, no Brasil, a lei da guarda compartilhada faz menção ao trabalho que deve ser realizado pelas equipes técnicas do Judiciário, ao dispor que: “para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar”. Nesse sentido, entende-se que as equipes técnicas podem auxiliar os
pais na estruturação, no entendimento e no cumprimento da guarda compartilhada após o rompimento da conjugalidade. Mostra-se necessária, portanto, a averiguação inicial da pertinência de se realizar apenas perícias e avaliações psicológicas em processos de
disputa de guarda. Agora, a preocupação dos profissionais deve estar centralizada na manutenção do convívio da criança com cada um dos pais e não na organização de um calendário de visitas, ou na procura do pai que reúna melhores condições para permanecer com a guarda (BRITO, 2003). Trata-se, assim, de uma política pública que pode funcionar como
apoio às necessidades das famílias contemporâneas.
         Por fim, é preciso destacar a importância do Código de Ética Profissional dos Psicólogos (2005), que deve balizar a atuação do psicólogo, mesmo porque trabalhando no meio de litígios alta a probabilidade de os profissionais serem envolvidos como protagonistas deles;
 Na categoria de marcos legais para aqueles que trabalham nessa área, não se pode deixar de mencionar a Resolução CFP nº 07/2003, que institui o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psicólogo, decorrentes
de avaliação psicológica. Essa resolução traz parâmetros importantes para a redação dos laudos psicológicos que, quando observados, podem reduzir ocorrências de faltas éticas. Como disposto nos princípios técnicos do citado manual: O processo de avaliação psicológica deve considerar que os objetos deste procedimento (as questões de ordem psicológica) têm determinações históricas, sociais, econômicas e políticas, sendo os mesmos elementos constitutivos no processo de subjetivação. O documento, portanto, deve considerar a natureza dinâmica, não definitiva e não cristalizada do seu objeto de estudo (CFP, 2003, p. 4). Ou seja, indica o CFP que os sujeitos incluídos nos processos judiciais não estão sozinhos no mundo, suas vidas encontram-se entrelaçadas às questões sociais, econômicas, históricas e políticas daquela sociedade, fatores que devem ser levados em consideração ao se proceder a avaliações psicológicas. Pode-se recordar, também, que nos princípios éticos listados no mesmo documento encontra-se a indicação de que: “deve-se realizar uma prestação de serviço responsável pela execução de um trabalho de qualidade cujos princípios éticos sustentam o compromisso social da Psicologia” (2003, p. 4).



In. Referências técnicas para atuação do psicólogo em Varas de Família / Conselho Federal de Psicologia. - Brasília: CFP, 2010. 56 p.

ISBN: 978-85-89208-32-1

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